A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial - SBPC/ML, sediada na Rua 2 de dezembro, 78, sala 909, Flamengo, Rio de Janeiro, Brasil, inscrita no CNPJ 34.265.017/0001-92 e a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas - SBAC, sediada na Rua Vicente Licínio, 99, Tijuca, Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, Brasil, inscrita no CNPJ sob nº 34.134.495/0001-20, entidades científicas sem fins lucrativos, vocacionadas à disseminação do conhecimento clínico-laboratorial para a melhor assistência ao paciente sob o pálio da ética e do compromisso com o seu bem-estar, vêm manifestar veemente protesto contra a conduta da operadora de plano de saúde BRADESCO SAÚDE de exigir dos profissionais médicos, como condição de cobertura contratual, o fornecimento de informações e dados clínicos relacionados aos seus pacientes (usuários), por meio de descabido formulário de justificativa técnica para exames laboratoriais.
Não é demais dizer que o conteúdo do mencionado formulário provoca legítima perplexidade tanto à comunidade médica quanto à população que busca melhores níveis de assistência à saúde, isso não só por conta da imposição, ao médico, para que responda a quesitos em quantidade e pertinência irrazoáveis, mas sobretudo em razão do objetivo e contexto discriminados no documento, cujos termos afrontam, a um só tempo, normas éticas, da legislação de consumo e da legislação regulatória.
A aplicação do formulário de justificativa técnica para exames laboratoriais compromete, sensivelmente, a autonomia profissional do médico, um dos princípios fundamentais de sua atuação. A garantia de liberdade do exercício da medicina pelo respeito à independência do médico assistente é o anverso da correção e eficiência médicas, como bem preconiza o Código de Ética Médica, de maneira que o BRADESCO SAÚDE, ao criar esse protocolo de revisão da prescrição de exames laboratoriais, no mínimo, desprestigia a capacidade técnica do profissional.
Se por um lado o formulário restringe a autonomia e capacidade técnica do médico, de outro, constrange o profissional a ir além dos limites éticos da atuação médica. A exigência de informações clínicas detalhadas destinadas a médico auditor induz à violação do sigilo na relação médico-paciente, um direito inalienável do paciente, cabendo ao médico a sua proteção e guarda.
Aliás, o melhor interesse do paciente foi outro aspecto completamente ignorado pela idealização do formulário. O BRADESCO SAÚDE acaba por desprezar a existência de consensos sedimentados de utilização de exames laboratoriais no processo diagnóstico, chancelados por órgãos regulatórios e fiscalizadores, a exemplo da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), os quais expressam a útil e relevante racionalização de recursos e métodos na prática da medicina. A imposição de justificativa técnica para exames laboratoriais através do citado formulário apenas visa a criar critérios sem amparo funcional, dificultando sobremaneira a eficiência do atendimento ao paciente, implicando até mesmo uma prática abusiva de consumo, uma vez que os exames laboratoriais já são integrantes do rol de cobertura obrigatória pelos planos de saúde.
Além de faltar-lhe respaldo sob as perspectivas ética e regulatória, o formulário carece de fundamento de ordem socioeconômica e atuarial. São amplamente aceitos a utilidade e o valor dos exames laboratoriais para a prática médica e sistemas de saúde, quer seja por meio de exames preditivos que possibilitam ações de prevenção, como para o diagnóstico (identificando agentes etiológicos causadores de agravos à saúde ou a origem de muitas doenças), ou, ainda, na definição e gerenciamento de tratamentos. Considerando o envelhecimento da população brasileira e a prevalência de doenças crônicas, é indispensável a utilização de exames laboratoriais.
Não por outros motivos, exames laboratoriais são essenciais e amparam mais de 70% das decisões médicas. E, também, não é por outra razão que a Organização Mundial da Saúde (OMS), em outubro deste ano, publicou a 4ª lista de exames essenciais recomendando sua utilização por governos.
De outra margem, os gastos com exames laboratoriais representam menos de 5% dos gastos totais dos sistemas de saúde. É inaceitável que Operadoras de planos de saúde, em um momento em que não acumulam resultados financeiros desejados, adotem medidas restritivas para realização de exames, por meio de criação de exigências burocráticas e infringindo normativas regulatórias e éticas, retardando ou impedindo o acesso a exames laboratoriais e tomando para si o julgamento sobre a validade ou legitimidade de solicitações de exames realizados pela classe médica.
A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial adota e defende, há vários anos, o conceito do uso racional dos exames laboratoriais. Desde 2018, a SBPC/ML divulga em conjunto com o Choosing Wisely Brasil, recomendações sobre práticas que envolvem exames de diagnóstico e intervenções em saúde, evitando desperdícios de recursos, além da conscientização deste tema nos seus eventos científicos.
A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial e a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas registram sua veemente contrariedade à conduta adotada pelo BRADESCO SAÚDE e esperam que a medida seja imediatamente revista, registrando que tomarão todas as medidas cabíveis para proteger o ato médico e os direitos dos pacientes.
Rio de Janeiro, 29 de novembro de 2023.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE ANÁLISES CLÍNICAS
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA/MEDICINA LABORATORIAL